1.2.20

OLHA E ESCREVE.


1 de fevereiro | OLHA E ESCREVE. Histórias inspiradas em imagens.


A partir de textos do Atlas do Corpo e da Imaginação, de Gonçalo M. Tavares com imagens dos Espacialistas:

Linhas de escrita:

Olhar e escrever a/sobre a imagem sem fazer legenda.
Resistir a contar a história linear.
Tentar fazer (com) o texto o mesmo que se fez para criar a imagem.

Escritos


Proposta 1: continuar o texto seguinte, escrevendo por pontos:


in, Atlas do Corpo e da imaginação






3. A casa é uma imagem de ti. Contém os teus segredos e manias e fala de ti com todos os seus recantos.

4. Esse carimbo que levas no pé ajusta-se às tuas marcas digitais e ganha espaço no mundo a cada passo que dás.
                                                                                                          Mariana Matias


3. Ou: será que a tua casa também não é a tua marca, não será também ela um poema, com o teu cheiro e a tua forma?
4. Sem dúvida que os poemas também deixam marcas, e as marcas podem ser caminhos e os caminhos podem não chegar a lado nenhum…
5. Ou: se não chegares a lado nenhum, também terás nada ou lado nenhum colado aos pés? Como as casas?
                                                                                                         Rute Gonçalves


3. Nada e longe muito a léguas de distância fica o interessante e disperso património carimbado.
Tudo a teus pés.
4. Ou aproveitar o que a. Vida nos planeou, revivendo e reinventando o futuro em bruto, ou internamente a sofrer pelos pontapés que ja não existem.
5. Habituas-te é como tudo na vida: Gosta-se não se gosta...
                                                                                                            Joana Dinis


3. O pé deita-se na casa, mesmo que tu já não te deites nela. Isto é um pouco poético, mesmo sem intenção. É uma metáfora.
4. Os pés descalços não se ouvem na casa. Quando não ouvimos caminhar, houve caminho? Velha pergunta ainda perguntada.
5. Ter um só pé angustia-nos. No entanto, as crianças riem muito a saltar ao pé-coxinho. Uma pegada pede dois pés?
                                                                                                       Cristina Borges



Proposta 2:  escrever sobre a imagem da capa do livro:




O que são os pensamentos, senão um conjunto de papéis escrevinhados e rabiscados repetidamente? Não será um amontoado de folhas de papel que são impressos à velocidade de uma ligação cerebral momentânea? E que se vão guardando ou perdendo no buraco negro da mente?
Pensamentos que vão e vêm, palavras escritas e sublinhadas a fluorescente, ou números a lápis ilegivelmente escritos, consoante a importância no espaço que é o nosso ser.

Imagine-se este metade humano, metade livro que se vai arrumando com folhas dispostas ordenadamente quando se encontra em momentos sérios e eloquentes ou em desordem gráfica quando há barulho dentro de nós?
Mariana Matias

A cabeça pende-lhe para a frente, como se lhe pesasse o cérebro. Visto de lado, não parece humano. Não se vêem os olhos, nem o nariz, nem a boca. A cabeça é enorme e está coberta de papel branco, espesso, completamente amarrotado, como se alguém inicialmente quisesse ter esculpido uma nuvem, mas sem sucesso. Em vez disso, em vez de uma cabeça coberta de nuvens (que bonito conceito), saiu uma cabeça de papel amarrotado. O resto do corpo não sabemos se existe. Não se vê, pelo menos. Deste lado da sala, apenas vejo uma cabeça de papel amarrotado que parece que flutua, porque não tem pernas, nem pés, nem nenhuma outra forma de suporte. Admito que é um pouco perturbante. Mas ao mesmo tempo é bonito.
Sempre gostei de amarrotar papel. Dá-me sempre uma certa esperança: como se fosse possível criar um novo começo.
                                                                                                      Rute Gonçalves


Berro o grito amarfanhado e desconstruído do tudo que foi até agora...
Está tudo livre afinal.

Já se ouve a voz. Desconcertante. Penetrante. Iminentemente apaziguada ou a caminho do nada. É tudo o mesmo…  em nada é muda. É mesmo a muda que não Muda. Ao contrario.
Imagino em imagens. Imagino em promessas. Imagino no fundo em fantasias...
Posso ir a todo o lado sem me meter num papel. Só que depois fujo e ja não sei de mim.
Escrevo a muda que não muda, falo paz, berro conquistas!
                                                                                                                 Joana Dinis


Papéis amarrotados na cabeça podem ser rascunhos de pensamentos. Só que não se pode pensar em rascunho. O pensamento é. Não há esboço de pensamento, tentativa de pensamento, semi-pensamento. 
Pensamos com palavras. Mas há também o cheiro a sopa, ou a alecrim, ou a cama ao acordar, ou a chuva no chão. E há a dentada no pão com manteiga quando temos muita fome, azeitonas pretas e verdes, maçãs de bravo. Ainda, a sirene dos navios no Tejo, a vizinha a chamar o cão que se chama Ruby, o eléctrico de ontem, o telefone a tocar. Já para não falar do vento, dos carros, das pessoas, das ondas do mar para a frente e para trás. 
Podíamos pensar com cheiros, ou sabores, ou até utensílios domésticos. 
Mas parece que só sabemos pensar com palavras. 
                                                                                                                   Cristina Borges

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