12.10.19

MAIS POR MENOS II



Sessão: 12 de outubro
TEMA: MAIS POR MENOS
Contar muito com poucas palavras. Histórias até 100 palavras.

Parte II - Contra-relógio de histórias

O processo: escrever o máximo de histórias em 20 m. a partir de 6 primeiras linhas tiradas de livros à nossa volta.


Não tinha asas
Olhava com inveja os outros ocupantes do armário. Invejava-lhes as formas, os volumes, a elegância dos acabamentos. Mas o que lhes invejava mais era a graciosidade que a asa lhes dava. Por mais que desejasse, sabia que nunca poderia ter uma: era, e seria sempre, um simples prato raso.

Aninhou-se para se proteger do frio
Andava às voltas pela sala toda, sentava-se a um canto, olhava e, volta, levantava-se e escolhia outro lugar. Repetia a mesma cena várias vezes durante largos minutos. Quando já estava cansada, arrastava uma manta e vinha aninhar-se aos meus pés para se proteger do frio. Era assim a minha cadela

Estavam na sala a beber vinho
Estavam na sala a beber vinho e nem deram por nada. Talvez fosse do excesso, talvez do calor da conversa sem nexo. A verdade é que quando um deles gritou ”traição” ficaram espantados ao perceber que a última garrafa de vinho que abriram afinal era de sumo de maçã. “Belo branco” tinha um deles acabado de dizer. “Belo idiota que tu és”, comentou o dono da sala.

Sentado num banco de escola
Saíram todos para o intervalo, mas ele ficou sentado, calado e corado, com uma lágrima a rolar lentamente pela face. As mãos agarravam com força a estrutura de metal frio da carteira e um alívio suave percorria-lhe o corpo. Na véspera tinha trocado os trabalhos de casa por uma futebolada com os outros rapazes da rua. O resultado estava à vista. Pelo menos, a equipa dele tinha ganho e os outros não se tinham ficado a rir, como de costume.

A tarde prometia chuva

A tarde prometia chuva, mas mesmo assim não desistiu de ir fotografar com a sua câmara de cartão e negativos de papel. Seria uma experiência interessante a de ver a câmara a desfazer-se no tripé. Um dia vai fazer isso mesmo, mas esse dia não foi hoje. Estava uma luz mortiça, com poucas sombras, mas nada de chuva. Quando acabou apareceu o sol e iluminou o jardim. Nem se falaram; antes a chuva.
Francisco Feio

Aninhou-se para se proteger do frio
A tarde prometia chuva, que teimava em não vir, o céu alaranjado ao longe e alargado deitado no mar, a chuva insistentemente não caía…
A tarde prometia chuva, com o céu já negro ela chegou. Anoiteceu a chover e ela aninhando-se para se proteger do frio, chorou.
Aninhou-se e calou-se.
Aninhou-se e adormeceu, acordou e estremeceu acordou e despertou, não, não tinha asas, mas voava e planava viajava, superava e infringia todos os obstáculos que a impediam e estar com ele. Sim não tinha asas, mas voava e amava aquele marido que lhe acontecera na vida.
Joana Dinis

Não tinha asas
Não tinha asas. Mas tinha uma linda auréola que ia mudando de cor consoante a temperatura. O Senhor gostava dele porque entre todos os anjos era o único que sabia rir. É certo que era um defeito da criação, mas as covinhas nas bochechas e as rugas à volta dos olhos agradavam-lhe. O Senhor queria fazer um molde dele, mas como tinha a eternidade à frente, já se sabe, ia adiando.

Estavam na sala a beber vinho
Estavam na sala a beber vinho. Foi o que os salvou. 
Cristina Borges

Não tinha asas
Perguntava-se desde sempre porque não tinha asas. Queria ser como os aviões, como os pássaros que via lá no alto do céu, queria sair do chão.
Quem inventou as pessoas não fez um trabalho muito bonito: temos olhos tão diversos, cabelos de todas as cores, temos inteligência, temos sentimentos e não temos asas porquê? Não fazia qualquer tipo de sentido. Pensou que tinha de fazer uma reclamação a alguém sobre este erro imperdoável, mas não sabia a quem endereçar a carta.

Estavam na sala a beber vinho
Estavam na sala a beber vinho, quando alguém bateu à porta com estrondo. Quem é? - Perguntou ele, com uma voz preocupada. Do outro lado da porta nada se ouviu. Apenas silêncio. Levantaram-se os dois num repente para ver quem era. Quem estaria a fazer tal barulheira àquela hora tardia?
Precipitaram-se para a porta, mas não encontraram ninguém. Apenas um simples bilhete que dizia: “Se o mundo acabar amanhã, pelo menos morrem felizes”. Olharam um para o outro e sorriram.

Sentado num banco de escola
Sentado num banco de escola, olhava fixamente para um carreiro de formigas que labutavam sem parar, mesmo ali junto aos seus pés e recordava os tempos longínquos em que tinha estudado ali. Tinha sido há tanto tempo, mas mantinha ainda mutas recordações alegres, dos dias felizes, das correrias com os colegas, do primeiro beijo dado às escondidas. Parece que não tinham passado 40 anos.
Rute Gonçalves





(fotos: nos.twnsnd.co)

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