12.10.19

MAIS POR MENOS I


Sessão: 12 de outubro
TEMA: MAIS POR MENOS
Contar muito com poucas palavras. Histórias até 100 palavras.

Parte I - Do texto ao micro-texto

O processo: história em 20 m. baseada numa frase de Pérez-Reverte de que uma das participantes se lembrou, «A solidão do ovo estrelado». Depois cada texto rodou e cada participante cortou. No final, surgiu um texto «cortado», e portanto escrito, por todos. 



texto 1 - original
Ouviu a frigideira a assentar no fogão, o gás a assobiar, o lume a acender, o azeite a cair no metal e o silêncio da espera que o calor aquecesse o conjunto. Sabia o que o esperava; já o tinha visto acontecer muitas vezes aos outros e não tinha razões para pensar que agora seria diferente. Ouviu o azeite a crepitar, sentiu-se a levantar no ar, olhou uma vez mais em volta para ver se teria companhia. Nada; apenas a superfície da frigideira. Sentiu uma pancada de lado, a casca a abrir e ele a escorregar para o calor. Ali estava ele, na solidão a frigideira, sem ao menos uma salsicha por companhia. Era um destino cruel. Ao menos que fizessem bom proveito.

texto 2 - aparado
Ouviu a frigideira a assentar, o gás a assobiar, o lume a acender e o azeite a cair. Não tinha razões para pensar que agora seria diferente. Ouviu o azeite a crepitar, sentiu-se levantar no ar, um apancada de lado, a casca a abrir e deixou-se escorregar para o calor, na solidão da frigideira, sem ao menos uma salsicha por companhia. Era um destino cruel. Ao menos que tivessem bom proveito. 
Francisco Feio


texto 1 - original
A minha mãe estava na cozinha. Deduzi que ia fazer o almoço.
“Mãe o que é o almoço?” – Perguntei, já com uma certa fome.
“São ovos estrelados” – respondeu-me ela com algum enfado – ela sabia que eu não apreciava ovos.
Passados uns minutos, chamou-me à cozinha: “Rapariga, fica aqui a tomar conta do ovo a fritar, enquanto eu vou fazer um telefonema” – E eu fui.
Enquanto tomava conta do ovo, e me assegurava que não ficava esturricado, deixei cair o garfo para o chão. Baixei-me para o apanhar e quando me levantei, o ovo não estava na frigideira. Olhei para cima, olhei para o lado, vi atrás do fogão. Nada… o ovo tinha misteriosamente desaparecido.
A minha mãe nunca percebeu esta história e nunca acreditou em mim…
O acontecimento ficou para sempre entre nós conhecido como o mistério da solidão do ovo estrelado.

texto 2 - aparado
“Mãe o que é o almoço?”
“São ovos estrelados” – respondeu-me ela.
Entretanto, chamou-me à cozinha: “Rapariga, fica aqui a tomar conta do ovo, enquanto eu faço um telefonema”.
Enquanto cumpria esta tarefa, deixei cair o garfo. Baixei-me para o apanhar e quando me levantei, o ovo não estava na frigideira. Olhei para cima e para o lado, vi atrás do fogão. Nada… o ovo tinha desaparecido.
A minha mãe nunca percebeu esta história e nem acreditou em mim…
O acontecimento ficou para sempre conhecido como o mistério da solidão do ovo estrelado.
Rute Gonçalves
texto 2 - original 
Ai o ovo, ai o ovo, ai o ovo..
Tão sozinho ele se sente…
Tão sozinho praticamente demente…
Ai o ovo, ai o ovo, ai o ovo tão doente.
Ainda cru, a mãe galinha olhava-o e pensava este pobre coitado ainda não percebeu que se queixa sem razão…
Olha, olha, olha, olha lá vem ela lá vem a mão lá vai ele para a frigideira.
Agora sim sozinho ele vai ficar.
Eis a solidão do ovo estrelado…
A meio rachado, frigideira a escaldar no azeite para o fritar, só a ele para ficar como o céu: estrelado

texto 2 - aparado
Ai o ovo, ai o ovo ai o ovo… Tão sozinho ele se sente...tão sozinho quase demente...ai o ovo, ai o ovo tão doente… a mãe galinha passava por ele e pensava: Este sortudo queixa-se, queixa-se e não sonha a boa vida que tem: sozinho sem ninguém a massacrá-lo, sem ninguém ali a pisá-lo…
Eis senão quando, lá vem a mão para o enfiar na frigideira e deixá-lo como o céu: estrelado…
Joana Dinis
texto 3 - original
A frigideira chiava no fogareiro, as salsichas foram atiradas com desprezo, depois estalou-se um ovo. Laura odiava o parque de campismo e ainda mais os tios, oleosos e gordos. Devia odiar também os pais, que a despachavam para ali todos os Verões, mas não. Os pais tinham um Jaguar e os tios tinham um Escort. Nisto tudo pensava Laura enquanto molhava a salsicha no ovo e os tios estrebuchavam ao lado. 

texto 3 - aparado
A frigideira chiava no fogareiro. Estalou-se um ovo.
Laura odiava o parque de campismo, os tios e os pais que a despachavam para li todos os Verões. Era nisso que pensava enquanto molhava a salsinha no ovo e os tios agonizavam ao lado.
                                                                                                                                          Cristina Borges



(imagem: stocksnap.io)

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